A LUTA LIVRE NO MUNDO
Todas as
histórias que envolvem as origens das diversas Artes Marciais e Lutas
(antigas), curiosamente se iniciam da mesma maneira. Assim, dizem os
textos:
“...A luta livre, a mais antiga de todas ...”
Aparecendo sempre um período de clandestinidade, de luta pela
sobrevivência com todos os ingredientes de um épico, que consegue
ultrapassar os séculos e chega até os dias de hoje. Tudo é muito
parecido, sendo os relatos mais antigos da faixa de 3000 anos (1000 AC).
Com a Luta Livre, a origem é bem diferente (a única modalidade de luta
que nasceu no ocidente), não existem regiões escondidas, príncipes e
guerreiros e nem influências, inspirações etc. A história é muito mais
simples. A Luta nasceu em cada lugar onde o homem apareceu. E junto com
ele se desenvolveu. Ela nasce “livre” como diz o próprio nome sem
adereços ou complementos, em consonância com a própria natureza. O homem
sempre lutou, e continuará lutando até o fim dos séculos.
No
começo da história humana os homens primitivos, a semelhança dos animais
também "brincavam" de lutar como até hoje fazem os filhotes dos
felinos, por exemplo. Além do componente lúdico, existia também um
aprendizado imprenscidível, a sobrevivência, onde os mestres eram
aqueles que os haviam gerado. Portanto não pode haver dúvida que a LUTA é
o mais antigo desporto e especificamente a Luta Livre, a mãe de todas
as outras modalidades de combate corporal.
Assim, em cada canto
da terra a luta surgia, se adaptando as condições e costumes locais aos
quais se rendia para poder sobreviver e continuar seu inexóral destino.
A primeira menção escrita (em caracteres cuneiformes) que se tem
registro, data da época dos Sumérios, aproximadamente 4000 AC onde no "
Poema de Gilgamesh" um rei descreve uma luta em detalhes. Mais tarde no
antigo Egito, nas tumbas da 5ª Dinastia 2470 AC, aparecem muitos
desenhos de luta onde os modelos às vezes eram crianças, o que garante o
componente esportivo e didático da atividade. E pasmem (!), as posições
mostradas são muito parecidas com as de hoje!
Outros
monumentos como os túmulos de Beni Hassam (400), Bahti III (219) e Sethi
(122) também mostram muitos desenhos até hoje preservados, de posições
de Luta livre, nas quais até hoje usamos.
Até na Bíblia existe
menção à luta. No livro de (Gênesis 32: 24 e 25) , Jacó luta durante
muito tempo com um adversário físico e meta físico (um anjo) que não o
conseguindo vencer, então desloca a junta da coxa de Jacó .
Também
Moisés, que foi ensinado a lutar como príncipe, já que era príncipe do
Egito, hà menção de que ele usou as técnicas da Luta livre, que lhe foi
ensinado pelo exército de Faraó, as quais estão registradas nos
hieroglifos egípcios nas tumbas dos faraós, pois, ele sozinho conseguiu,
defender as filhas do seu futuro sogro, quando foram atacadas por “uns
pastores” (Êxodo 2:16 ao 19).
Na Grécia antiga, aconteceram
tentativas de "criar" uma origem mística para a luta dizendo que ela
tinha sido inventada por Herakles, Hermes e Palestra e então integrada
aos Jogos Olímpicos. Naquela época não havia categoria de peso ou tempo
de luta. Havia entretanto diversas modalidades, o Pancracio (considerada
a mais violenta) e as Lutas, que se dividiam em 3 especialidades:
• Ortopalio -luta mais aceita nos antigos Jogos Olímpicos que dava a vitória aquele que tombasse três vezes o adversário.
• Alindissis - Especialidade praticada nos treinamentos, semelhante à
Luta Livre de hoje. Terminava com desistência de um dos lutadores.
• Acrocrismos - Um tipo de luta de pegada de dedos que provocava muitas contusões.
Como curiosidade, é impressionante como alguns artistas da época
mostravam na pintura e especialmente nas esculturas com meticulosa
precisão as lesões resultantes das lutas, no nariz, nas orelhas etc.
A "Lex Aquilia" do estado Romano em 150 AC condenava ao culpado a
ressarcir pelos danos causados ao outro atleta no combate. Da mesma
forma penalizava com rigor os que tentavam causar sérios danos ou a
morte ao adversário.
Vale lembrar que sempre houve um estreito
relacionamento entre o desenvolvimento da luta e o desenvolvimento
sócio-econômico e político das regiões. Por outro lado, a própria
vontade de domínio individual e auto-superação sempre alavancaram de
alguma forma o desenvolvimento da luta.
Seria oportuno lembrar
que a origem da Luta Livre, se funde com a da Luta Olímpica (Wrestling),
especialidade que hoje tem sem dúvida o maior número de praticantes no
mundo (mais de 30.000.000) entre todas as lutas genericamente falando
(artes marciais). Sem dúvida a maior e mais consistente bibliografia,
onde aparecem as pesquisas mais confiáveis, os trabalhos com o melhor
embasamento técnico etc. são referentes a Luta Olímpica, tudo graças as
excelente apoio dos órgãos dirigentes da modalidade, comandados pela
Federação Internacional de Luta e Associadas (FILA) com sede em Lausanne
na Suíça, que serve de exemplo para as outras modalidades.
Dada a múltipla origem da luta, sempre ligada ao próprio nascimento das
diversas civilizações, existe uma centena de lendas e histórias, que já
fazem parte do folclore de cada povo.
O Brasil também tem a sua
luta raiz, o "Uka-Uka" dos índios nativos, que faz parte da tradicional
festa dos índios da tribo Xavante, o "Quarup". A partir de 776 AC, na
Grécia a luta se tornou parte central dos Jogos Olímpicos e lá surgiram
papiros que definiam os procedimentos da luta etc. Tal era a
popularidade da luta que em quase todas as escolas havia um escrito
"Primeiro aprender a lutar na Escola, depois entre em Competições".
Em Roma a luta nasceu como herança dos antigos Etruscos e da influência
dos Gregos. Estava bem claro que os romanos preferiam as facetas mais
violentas da luta, como o “Pancratium” (mencionados anteriormente), e a
luta entre os gladiadores, mas ela servia como preparo para os soldados e
gladiadores. Da mesma forma quando era necessário escolher os líderes
da tropa a luta era escolhida como critério através de uma competição.
No Japão, o Sumo é considerada a luta mais antiga, havendo registros do
início da era Cristã de formidáveis competições cujos campeões são
lembrados até hoje, como patronos da modalidade.
No Irã e na
Turquia havia uma enorme variedade de lutas e seus campeões eram
considerados heróis, usufruindo de grandes prestígios na comunidade.
Antes do século XV já havia escolas de lutas que ensinavam métodos
definidos, e também grandes torneios com centenas de participantes. Mas,
com tudo, não escapou a regra geral: período de “formação”, “apogeu” e
“decadência”.
Na Ásia pode se considerar que o desenvolvimento
se iniciou por volta do ano 200 da era Cristã, especialmente na China e
na Mongólia, onde a semente germinou tornando-se matéria obrigatória nas
escolas à partir do século III. Na Índia, os épicos hindus “ramayana” e
“mahabbarata” testemunharam a prática da luta. Até Buda, teria lutado
pela bela princesa Gopa. Na Rússia, a partir do ano 1000 existem muitos
registros e no resto da Europa, sempre apoiado nas lutas raízes ela foi
se desenvolvendo em praticamente todas as regiões, surgindo na segunda
metade do século XV os primeiros “manuais de luta”, publicados na
Alemanha em 1443. Posteriormente, em 1539, na cidade de Willenberg,
Fabien Von Auerswald escreveu “A Arte Da Luta”.
Além dos
escritores aficionados havia naquele período, excelentes pintores de
prestígio que fizeram dezenas de ensaios e pinturas, mostrando
didaticamente, posições de luta.
Na época feudal, a luta se desenvolveu seletivamente, pois apenas aqueles ligados aos senhores tinham condições de praticá-la.
Finalmente no início do século XX a luta se tornou o esporte mais
popular do mundo. Daí em diante aquela fase de íntima ligação das Lutas
Olímpicas e da “nossa” Luta Livre, começou a se dissipar.
A
Luta (Submission Grappling), praticamente foi amassada pelo imenso
sucesso das “Olímpicas”, tendo vivido no mundo alternativo durante muito
tempo. Naquele mundo se apoiou também nos praticantes da chamada Luta
Profissional (Catch, Pró Wrestling etc.) a famosa “marmelada” e de
amadores das lutas de kimono que eventualmente treinavam sem o “paletó”.
Um dos maiores centros de prática da luta era o Brasil, onde
entretanto, não havia aquelas condições necessárias ao perfeito
desenvolvimento. As condições são bastante claras e simples: existirem
pessoas que possam viver da luta e haver competições. Mesmo assim, as
coisas caminharam e o Brasil se tornou uma força na Luta Mundial, embora
até hoje sem a organização que se faria necessário. Japão e Estados
Unidos, caminharam juntos também, sem entretanto atingir o nível do
Brasil. Um dos fatores que mais alavancaram a Luta, foi o ressurgimento
do “Vale Tudo” (“No Holds Barred” ou “Mixed Martial Arts”) com diversos
eventos importantes no Brasil, Estados Unidos e Japão. No Brasil,
observei que até 1960 o conhecimento da luta livre, era incipiente ou
deformado, pois, mais de 80% dos praticantes era halterofilista ou
remador. Só eram conhecidas umas poucas técnicas como chaves de braço,
gravatas de frente (atualmente guilhotina) etc. Em vinte anos ficou
patente que a situação mudou e novas escolas surgiram, com novos métodos
de ensino. A “inteligência”, a “habilidade”e a verdadeira técnica
começaram a ocupar o seu espaço, e naquela oportunidade eu graças a
minha compleição física (pequeno, leve, embora forte), tive a imensa
felicidade de poder colaborar efetivamente com aquele desenvolvimento. O
“truque” foi enfrentar os fisicamente privilegiados com sucesso, pois
os praticantes daquela época só entendiam a linguagem “do fazer”. Por
outro lado, aquela fase foi um excelente laboratório que dá frutos até
hoje. Mais dez anos se passou e o Brasil começou a exportar seus
talentos, sendo o grande catalisador do desenvolvimento dos outros
centros.